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Jéssica S. Y. S. Oliveira; Felipe S. Silva; Fernanda R. Menegaldo; Marco Antonio C. Bortoleto
Motricidades: Rev. SPQMH, v. 4, n. 3, p. 272-285, set.-dez. 2020 | ISSN 2594-6463 |
DOI: http://dx.doi.org/10.29181/2594-6463.2020.v4.n3.p272-285
construído no decorrer do semestre. E vamos aprendendo a juntar ideias, compartilhar,
unir, discordar com empatia, respeitar e criar” (CE4).
Ademais, a relação entre participação ativa e desenvolvimento de habilidades
sociais merece destaque, pois converge com muitos relatos de experiência e pesquisas
da área, que dizem que a GPT promove a interação social, ou ainda, a socialização
(MENEGALDO; BORTOLETO, 2020b; SILVA, 2020). De forma mais profunda, essa
relação pode ser explicada na medida em que entendemos a cooperação – elemento
chave da prática da GPT a partir de seu entendimento como uma prática em grupo, ou
ainda, sociomotriz (PARLEBAS, 2001; MENEGALDO; BORTOLETO, 2020a) – como
uma habilidade social, nos termos de Sennett (2012). Dessa forma, as participantes, ao
serem expostas semanalmente a dinâmicas essencialmente colaborativas que promovem
o exercício de expor opiniões, concordar, discordar, dialogar, preferencialmente em uma
perspectiva dialógica, acabam aprimorando essa habilidade: “[...] torcemos o nariz para
algumas sugestões, adoramos outras, tivemos mais empatia com alguns do grupo, mas
no final foi um trabalho, literalmente, em conjunto!” (CE4).
Assim, a prática da GPT responde a demandas físicas, mas também sociais do
processo de envelhecimento (BUKOV; MAAS; LAMPERT, 2002; HUXHOLD;
MICHE; SCHÜZ, 2014; PINTO; NERI, 2017), momento da vida comum a todas as
integrantes do projeto. O convívio nesse espaço, portanto, extrapola as expectativas
comumente associadas à prática da atividade física por esse público e tem como produto
não apenas o movimentar-se. O que nos chama a atenção após esse processo é que, mais
do que uma coreografia de ginástica, amizades são construídas no espaço de prática
(MENEGALDO; BORTOLETO, 2020c). CE9 corrobora essa ideia, dizendo que a
prática, “[...] além de mexer com nosso corpo, estimula a criatividade, possibilita a
socialização, pois a cada aula entrelaçamos nossas amizades”.
Nesse sentido, identificamos nos registros da CE6 uma fala muito potente: “[...] a
princípio, eu não estava disposta a aceitar fazer parte da apresentação. Porém, como
havia criado uma conexão com o grupo, fui forçada, ou melhor, impulsionada por essa
amizade”. Então, após ter relatado ter muita vergonha e timidez, CE6 indica o papel das
relações de amizade construídas no grupo para uma superação pessoal: participar de
uma coreografia e se apresentar em público. Além disso, nas entrelinhas do DE, foi
possível identificar que a superação é algo latente também para outras integrantes,
caminhando lado a lado com a categoria de análise: acessibilidade e respeito dos limites
individuais. Entre as passagens que destacam essa virtude da prática, temos o
comentário que CE3 fez durante as aulas: “[...] os limites são sempre respeitados,
integrando todos ao mesmo tempo, sem discriminações”. Além disso, CE7 afirma que
“[...] todos participam de acordo com suas possibilidades e condições físicas,
interagindo com o grupo de alguma forma”.
Por sua vez, essa acessibilidade está relacionada à ausência de regras e códigos
gestuais, possibilitando um outro lugar para a prática da GPT que não o da performance:
o lazer. Estudos anteriores já trataram dessas experiências e teceram reflexões sobre a
prática da GPT como uma vertente da ginástica voltada ao lazer (FERNANDES;
EHRENBERG, 2012; FIORIN-FUGLSANG; PAOLIELLO, 2008; OLIVEIRA, 2007),
perspectiva que corrobora as premissas da FIG acerca dessa prática gímnica (FIG,
2019). Considerando isso, a GPT oportuniza uma prática que contempla, já na teoria,
corpos com muita ou nenhuma experiência corporal e gestos embebidos de muito ou
nenhum conhecimento gímnico, em uma liberdade que tem relação com a flexibilização
do conceito de “técnica”, nos termos de Bortoleto (2008).
Para além da teoria, propiciar um espaço de prática da GPT que seja coerente com
esse potencial depende também da metodologia empregada para seu desenvolvimento.