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Andréia Cordeiro Mecca; Miriã Martins de Brito
Motricidades: Rev. SPQMH, v. 5, n. 1, p. 55-64, jan.-abr. 2021 | ISSN 2594-6463 |
DOI: http://dx.doi.org/10.29181/2594-6463-2021-v5-n1-p55-64
TRABALHO COMO PROPOSTA DA SOCIEDADE CAPITALISTA
A revolução francesa de 1789 marcou, na história ocidental, o fim do feudalismo
e início do sistema econômico burguês, o capitalismo. Porém, a transição entre esses
dois sistemas é mais longa e ocorreu no decorrer de séculos, antes e depois desse marco.
Também é preciso salientar que em muitas comunidades, na maioria originárias, o
capitalismo não foi implementado, ainda que existam relações sociais e econômicas em
alguns casos.
No sistema capitalista, a manufatura foi substituída pela máquina a vapor e depois
pela eletricidade. Nesse processo, a relação entre empregador/e trabalhador/a
modificou-se, ocorrendo intensa divisão do trabalho. Sendo assim, cada trabalhador/a
assumiu um posto dentro do processo produtivo, ou seja, uma tarefa específica regida
pelo tempo da máquina. Também se aprofundou a separação entre capitalista e
trabalhador/a, cuja relação se deu em grande medida por aspectos econômicos, isto é,
pela compra e venda da mão-de-obra. Outra importante característica é a produção em
grandes escalas e no menor tempo possível. Segundo Marx (2010):
Não é por o trabalho se tornar mais intenso ou por se prolongar a duração do
processo de trabalho; nem é por o trabalho ganhar maior continuidade e, sob
o olhar interessado do capitalista, mais ordem, etc., que se altera em si e para
si o caráter do processo real do trabalho, do modo real do trabalho. Surge
nisto, pois, um grande contraste com o modo de produção especificamente
capitalista (trabalho em grande escala, etc., que, como indicamos, se
desenvolve no decurso da produção capitalista e revoluciona não só as
relações entre os diversos agentes da produção, mas também
simultaneamente o caráter desse trabalho e a modalidade real do trabalho no
seu conjunto [...] (p. 89).
Para aumentar a escala, foi necessário primeiro conquistar novos mercados e
depois subtrair a demanda da produção. Os produtos, que antes eram feitos sob procura,
passaram a ser fabricados continuamente, transmutando a centralidade da produção, que
residia na necessidade do/a consumidor/a, para a mercadoria em si mesma. Portanto, a
busca por novos mercados, em expansão com as grandes navegações, foi fundamental
para o avanço desse sistema. De acordo com Marx e Engel (2007):
A manufatura e, em geral, o movimento da produção experimentaram um
enorme impulso graças à expansão do comércio ocorrida com a descoberta
[invasão] da América e da rota marítima às Índias Orientais. [...] enquanto as
expedições de aventureiros, a colonização e sobretudo a expansão dos
mercados até a formação de um mercado mundial - expansão que, então, se
torna possível e realiza-se cada vez mais, dia após dia - despertam uma nova
fase do desenvolvimento histórico [...]. Mediante a colonização dos países
recém-descobertos [invadidos], a luta comercial entre as nações ganhou novo
alinhamento e, nessa medida, uma extensão e uma animosidade maiores (p.
57).
A produção contínua e a inexistência de leis de proteção aos/às trabalhadores/as,
tornou comum jornadas de trabalho de 12h a 17h horas, executadas tanto por adultos,
quanto por crianças. Em alguns lugares, a jornada era tão extensa que as pessoas
paravam apenas para dormir, o que poderia ocorrer na própria fábrica; também alguns
padeciam em frente à máquina. Lafargue (1999) conta o caso da cidade de Mullhouse,
no ano de 1838, onde trabalhadores/as moravam em habitações miseráveis, a milhas de
distância do trabalho, com jornadas de 17h e com período de alimentação de apenas